Saudações, confraria!
Em novembro comprei um exemplar da biografia do Barsi, entitulada "O Rei dos Dividendos", lançada em outubro desse ano, e vou postar aqui uma resenha, com alguns comentários meus e destacando os pontos que achei mais interessantes.
"O Rei dos Dividendos", escrito pelo Luiz Barsi Filho, um dos mais ricos investidores de nossa Bolsa, é um livro bem fluido e de fácil leitura, não entra em detalhes chatos e nem em minúcias, de modo que o li bem rápido.
Achei a leitura interessante. O início narra a origem humilde do velho investidor, nascido em uma família pobre em 1939, morando em um cortiço em São Paulo junto de outras famílias imigrantes européias, o início da vida profissional ainda na infância, vendendo uvas passas no cinema...
Depois ele conta como se formou em um curso de técnico de contabilidade e começou a trabalhar. Foi através dos conhecimentos de contabilidade que ele iniciou sua jornada nos investimentos, pois aprendeu a analisar empresas. Posteriormente se formou também em economia. Uma coisa que o favoreceu foi o fato de que quase ninguém tinha estudo naquela época (anos 60). Destaco o seguinte trecho do livro (página 32):
"No final dos anos 50 e início dos 60, mais de 70% dos brasileiros tinham no máximo 3 anos de estudo. Só 1 em cada 100 trabalhadores havia completado o ensino superior. Com meu diploma de técnico contábil eu já era a pessoa que tinha um olho só em terra de cego. Economista e contador formado, então, nem se fala."
Além de seu emprego, ele também dava aulas de contabilidade e fazia auditorias por fora, para ganhar uma renda extra (ter mais de uma fonte de renda é cada vez mais importante, confrades... vamos buscar!)
Chegou a trabalhar um curto período em uma pequena estatal, com um salário bom para a época, mas largou o emprego (por causa das limitações do serviço público) e passou a se dedicar ao mercado de ações, no início somente com o dinheiro das aulas e das auditorias, e posteriormente (por volta do fim dos anos 60 e do início dos anos 70) com o dinheiro que recebia sendo sócio de uma corretora chamada "Cruzeiro do Sul", uma das 134 corretoras daquela época. Também passou a ser operador de pregão, atuando através de sua corretora.
A sociedade na corretora não durou muito tempo, e a mesma foi vendida em 1971. A partir daí, Barsi foi trabalhar como operador na corretora "Montanarini". Pelo visto, ele e seus sócios tiveram sorte ou foram visionários, pois em 1971 houve um crash no mercado de ações brasileiro que contribuiu para afastar os investidores pessoa física por muitos anos (o livro dá a entender que este crash originou o cliché de chamarem a bolsa de "cassino" por aqui - talvez esta tenha sido a expressão empregada pelos jornais da época, ou pelas pessoas que talvez tenham sido entrevistadas. E até hoje há quem compare as bolsas de valores em geral a cassinos ou coisas similares. E certamente esse crash foi um dos fatores motivadores para a publicação da Lei das S.A. em 1976)
Com sua crescente fama nos pregões, ele eventualmente foi convidado para escrever no jornal "Diário Popular", onde trabalhou como editor e colunista por 17 anos.
Após o crash de 1971, ele continuou trabalhando como corretor, e já vislumbrava a inviabilidade de se aposentar pelo INSS (na época, INPS). Destaco o seguinte trecho (páginas 73 e 74):
"Talvez eu tenha enxergado algo que era difícil perceber naquele momento (...) Os sinais já estavam no horizonte. As mulheres ensaiavam sua entrada no mercado de trabalho, o número de filhos por família começava a diminuir, avanços na medicina e nas condições de saneamento favoreciam a longevidade e, bem, já era possível suspeitar que em algum momento no futuro não haveria gente suficiente trabalhando para manter os aposentados. Vale lembrar que nossa previdência é estruturada de tal modo que quem trabalha sustenta os que já se aposentaram".
Foi com base nestas ideias que ele resolveu montar sua "carteira previdenciária", pois estava convencido que o INSS era insustentável e mesmo que entregasse o que prometia, ele receberia uma aposentadoria medíocre.
Resolveu então focar ainda mais no recebimento de dividendos, com vistas a montar uma carteira que o sustentasse na velhice. Chegou até mesmo a escrever e publicar uma cartilha (intitulada "Ações garantem o futuro") explicando este raciocínio.
Posteriormente ele conta outras histórias no livro, focando em suas participações na Klabin, Eternit, e Unipar. Nestas empresas ele adquiriu imensa quantidade de ações, na casa das milhões de unidades, para receber muitos dividendos e principalmente para ocupar cadeiras nos conselhos, ter o direito de indicar pessoas de confiança para cargos-chave e, com isso, influenciar o andamento de seus negócios.
As ideias centrais do Barsi, no que tange às finanças pessoais, pelo que se entende da leitura de sua biografia, são as seguintes:
- Comprar ações de boas empresas (com bons projetos e já consolidadas) na maior quantidade possível (para receber muitos dividendos), todo mês.
- Não diversificar muito (ele diz no livro que a carteira dele sempre tem algo em torno de 12 ações diferentes, e faz a analogia de serem uma para cada mês do ano, como se ele buscasse garantir que todo mês receberia dividendos) - acho que a ideia dele de não diversificar muito vem do fato de ele gostar de comprar muitas ações da mesma empresa
- Se possível, tornar-se um acionista minoritário relevante, com participação no conselho da empresa e ser capaz de influenciar os rumos do negócio (mais um motivo para ele não gostar muito de diversificar)
Porém nem tudo o que o Barsi escreveu e falou é aplicável por pessoas comuns:
"começar devagar, comprando 1.000 ações todo mês" - pode ter sido figura de linguagem, mas se ele foi literal, isso não é possível de ser feito pela vasta maioria dos brasileiros que investem na bolsa. Pelo menos no caso de algumas empresas seria necessário aportar muito dinheiro de cada vez: para comprar 1.000 ações da Petrobras custaria, hoje, uns R$ 35.000,0. Para comprar mil ações da Arezzo seria uns R$ 84.000,00. Acho mais provável que ele tenha usado uma figura de linguagem.
"conversar com os diretores, executivos e CEO das empresas para conhecer o negócio" - para ele é perfeitamente possível, tendo em vista sua fama e fortuna, mas para nós pequenos acionistas isto seria bastante difícil, senão impossível: se às vezes até mesmo os departamentos de Relação com Investidores (RI) nos ignoram na cara de pau, que dirá os CEO, altos executivos, etc.
Para finalizar, algumas frases interessantes que eu pesquei do livro:
"Na hora de adquirir papéis, é importante conhecer o interesse do controlador ou dos controladores de um negócio" - o máximo que podemos desfrutar disso é surfar na onda dos controladores, e neste ponto eu concordo com o Bastter que o melhor jeito é tendo ações ON.
"(...) se eu não pensasse grande, ninguém pensaria por mim"- essa é uma das frases mais interessantes e verdadeiras do livro, na minha opinião. Pelos outros, você sempre será um serviçal, um capacho, um personagem secundário, um figurante, etc. Além de você mesmo e de sua família, ninguém tem interesse que você cresça, se desenvolva, nem melhore.
"Independentemente da moeda (...) a palavra 'milhão' tem um papel relevante no imaginário da nossa sociedade" - enquanto uma moeda não se degenera pela inflação, isto é verdade mesmo. Mas óbvio que se a moeda for estragada, isso perde o sentido (lembrem da nota de 100 trilhões de dólares do Zimbábue)
"Não compro o que não conheço ou não consigo entender" - é aqui que a maioria das pessoas cai nas armadilhas do mercado e da vida de modo geral. E não me refiro somente a ações, criptomoedas, etc. Me refiro também a pessoas entrando de trouxa em pirâmides, negócios escusos, etc.
"Não me canso de falar que o cidadão deve adquirir ações para comprar e guardar. Não deve pensar em si mesmo como um acionista minoritário, mas como um pequeno dono. Um dono não vende a empresa porque os papéis caíram ou porque subiram demais. Ele pensa na perenidade do negócio" - acho que esta é a melhor maneira de um pequeno investidor pessoa física sobreviver na bolsa, tendo a mentalidade de sócio (também defendida pelo Bastter) e ignorando notícias e cotações.
Esta foi a primeira vez que li algo do Luiz Barsi. Nem mesmo nos meus tempos de sardinha abissal (em que eu perdi um dinheiro com a OGX, conforme já relatei aqui no blog) eu sequer havia ouvido falar nesta personalidade de nossa bolsa.
Embora eu não concorde com todas as ideias defendidas (eu sou a favor da diversificação) e acredite que ele não contou tudo o que ele faz (afinal, se ele contasse os seus "pulos do gato" não seria bilionário) e nem tudo o que ele fez (me parece haver um gap na história profissional dele, na forma como foi narrada), achei uma leitura interessante. Nota 8/10.
O que acham do Barsi, confrades?
Forte abraço!
Fiquem com Deus!