segunda-feira, 27 de junho de 2022

Um olhar crítico sobre nosso sistema de ensino

A questão da educação e do ensino no Brasil, nossa querida Terra de Santa Cruz,  é algo problemático já há algumas décadas. 

Não sei quando o problema começou,  de fato, e sei através de relatos de parentes e amigos que exercem o magistério, que hoje em dia está muito pior do que quando ocupei os bancos escolares. 

Também sei que na minha época já estava pior do que na de meus pais, mas acredito que na época deles as coisas estavam melhores do que na de meus avós. Então creio que o problema tenha começado mesmo por volta dos anos 60 ou 70, embora suas sementes provavelmente já estivessem plantadas há muito mais tempo. O problema não é só administrativo, mas também cultural, mas este assunto fica para outro post.

Se vocês pesquisarem, verão que a degradação do ensino não é um fenômeno exclusivo do Brasil... até as famosas e caríssimas universidades da "Ivy League" estão degradadas e decadentes, embora ainda sirvam para enfeitar currículos mundo afora...

Mas isto também  é assunto para um futuro post. Neste aqui me aterei apenas ao Brasil.

Vejam se a experiência que vocês passaram nos anos de escola não é parecida com o que vou descrever:

O nosso sistema de ensino se divide em basicamente 4 fases: primário,  ginásio,  ensino médio e faculdade (uso a nomenclatura da minha época de aluno).


É no ensino  primário que aprendemos o básico e , no fundo, aquilo que é mais útil pra vida: ler e escrever em português, as 4 operações fundamentais de matemática, frações, porcentagens, e o basicão de ciências, geografia e história. É o mínimo para ser funcional em praticamente qualquer emprego, e também julgo necessário saber o mínimo de biologia para viver (pelo menos onde estudei, aprendíamos até a quarta série o básico do funcionamento do corpo humano, o básico sobre plantas e animais, alguns cuidados que temos que ter com a comida, etc.). 

E, embora a maioria das pessoas nunca vá usar os conhecimentos de geografia e história para ganhar dinheiro, não acho que seria bom que em uma sociedade a maioria das pessoas não soubesse absolutamente nada de geografia e de história do mundo e da história de seu próprio país. Acho que todos temos que saber alguma coisa destes assuntos, pois é essencial ter um mínimo de cultura! 

Não concordo com as ideias, defendidas por alguns, de que somente devemos aprender o que for útil para o trabalho, pois assim seríamos reduzidos a meros "burros de carga", seres incultos que só sabem coisas relativas a suas próprias profissões, como formigas operárias. Isto reduziria o ser humano a algo só um pouco acima dos animais, em minha opinião.

pena que salas de aula arrumadinhas assim sejam exceção no Brasil...


Quando chegamos ao Ginásio e depois ao Ensino Médio as coisas estão estruturadas de maneira que é praticamente só um repeteco mais aprofundado do que vimos no primário, com a inclusão de algumas poucas coisas novas (física e química, principalmente) e entra muita coisa que é só decoreba pro vestibular, principalmente a parte de história, geografia e filosofia no ensino médio. Claro que algumas coisas aprendidas nesta fase são úteis, mas é cada vez mais notório que o objetivo é só preparar os alunos para o ENEM, numa espécie de "linha de montagem" (além da doutrinação vermelha).

Depois do ensino médio, infelizmente, o normal na época de fazer os vestibulares é estudar tudo de novo, em um cursinho preparatório (às vezes esse cursinho é feito durante o terceiro ano do ensino médio e algumas escolas oferecem esse curso no contra-turno do aluno). O cursinho pré-vest simplesmente condensa em uns 7 ou 8 meses tudo o que foi transmitido nos 3 anos de ensino médio, fazendo uma grande "paçoca" de conhecimentos, muitos dos quais são decorados.

Na hora do vestibular, o aluno "vomita" na prova todas as informações acumuladas em tantos anos de repetição e decoreba na época de escola e no cursinho pré-vestibular, e via de regra esquece a maioria das matérias logo depois.


Ironicamente, o aprendizado mais útil da época do ginásio e do ensino médio são os idiomas (geralmente as escolas ensinam inglês e/ou espanhol, e umas poucas ainda ensinam francês como matéria optativa), mas os alunos em geral tratam essas matérias como simples decorebas ou nem aprendem, e as escolas quase sempre permitem que eles passem automaticamente de ano, pois por aqui já algum tempo há uma cultura muito forte de "ah, você não vai fazer o aluno repetir de ano por causa de inglês,  né??". E fica por isso mesmo. O público meio que já se acostumou com a ideia de que "inglês de escola é ruim".

(Por exemplo, na minha época de ensino médio, na minha escola havia um sistema de monitoria, e eu fui o monitor de inglês da minha turma durante os 3 anos do ensino médio. Eu dava aulas de reforço para diversos colegas que não só não sabiam nada de inglês, mas também não queriam nem se esforçar para aprender. Fiz dezenas de redações para que meus colegas de turma decorassem-nas e as "vomitassem" na prova, não importando qual de fato seria o tema da redação da prova...bizarro demais! Os caras se dispunham a decorar redações de 20 linhas, mas não a aprender inglês!)

Durante a faculdade, há muitas matérias que não acrescentam em nada nem para a profissão que está sendo aprendida e nem para a cultura geral do aluno, e estão lá somente porque o MEC determinou que os cursos de bacharelado devem obrigatoriamente ter 8 períodos e determinada carga horária mínima, como se todos os cursos fossem exatamente iguais (eu sei que tem faculdades que permitem puxar "N" matérias, de modo que tem gente que consegue se formar em 3 anos, mas estes casos são exceção)

Uma coisa interessante que eu noto principalmente nas redes sociais e em sessões de comentários de sites em geral: é muito engraçado ver como hoje em dia em qualquer discussão na internet tem gente dando "carteirada de diploma", e às vezes até dando carteirada de "estar cursando" determinado curso. 

Tendo em vista que o perfil médio do universitário brasileiro é aquele cara que foi para a faculdade só pra ir em chopada e frequentar o barzinho local, matava aula direto (só tomando cuidado para não ser reprovado por falta), estudava só de véspera e passava raspando na maioria das matérias  (isso quando não pedia para o professor dar mais meio ponto) e pagou alguém para fazer o TCC, então há uma boa chance de que aquela pessoa que está te dando carteirada com o diploma numa discussão ter sido esse tipo de universitário. 

Afinal, com que autoridade uma pessoa dessas dá carteirada? Só porque tem um pedaço de papel mal e porcamente merecido? Será que essa pessoa fez algum trabalho realmente relevante em sua área de conhecimento ou será que produziu por obrigação mais um TCC de 20 ou 30 páginas que nunca será lido por ninguém (talvez nem pelo orientador)? 

Acho que algumas ideias para para resolver um monte desses problemas, ou ao menos dar o pontapé inicial seriam:

1) Somente o ensino primário ser obrigatório (para todo mundo saber ler, escrever e pelo menos as 4 operações fundamentais) ou pelo menos somente as matérias que mais se aproximam daquelas do "trivium" e, mais tarde, do "quadrivium", serem obrigatórias, com o restante das cadeiras sendo eletivas e cada aluno montando sua grade ao longo dos anos de escola conforme o interesse e o pendor de cada um;

2) Focar o ensino primário em leitura, interpretação de texto, raciocínio lógico e matemática (que são áreas muito defasadas no nosso Brasilzão de Deus) 

3) Diminuir o número de vagas da maioria dos cursos superiores (muitos cursos formam um número de profissionais muito superior à demanda do nosso mercado, o que achata os salários) 

- edit (9/8/22): aumentar o número de vagas pros cursos de medicina, pois apesar do que dizem, há poucos médicos no Brasil, e muito concentrados nas capitais;

- edit (27/3/2023): diminuir também o número de vagas para o ensino médio, e direcionar aqueles que não fossem cursá-lo para cursos profissionalizantes, para que aprendessem ofícios.

4) Acabar com qualquer forma de aprovação automática em todas as etapas do ensino;

5) Focar em abrir mais escolas técnicas / profissionalizantes, e não em abrir universidades (no Brasil tem muito "doutor" e pouco eletricista, encanador, mecânico, etc. que sejam realmente técnicos);

6) Acabar com o currículo obrigatório (exceto talvez para o trivium e quadrivium), e permitir que cada escola tenha o seu próprio currículo personalizado para as peculiaridades locais de cada região e/ou de seu público;

Edit (27/3/2023): 

7) impor uma idade máxima para cada série (e com isso acabar com o absurdo de, por exemplo, adolescentes de 15 anos ou mais na quarta série, dividindo a sala de aula com crianças de 10 anos, que vemos em algumas escolas)

8) em complemento ao item 7, impor um número máximo de reprovações aos alunos (prevendo a expulsão de quem repetir de ano mais do que, por exemplo, duas vezes)

9) Tornar obrigatória a apresentação de algum comprovante de trabalho (carteira de trabalho, contrato de PJ, recibos de autônomo, etc) para frequentar EJAs;

10) direcionar os alunos expulsos das escolas (por conta dos itens 7 e 8), bem como quaisquer alunos e demais pessoas interessadas, para programas de ensino profissionalizante, para que aprendam ofícios.

Edit (16/9/2024):

11) Criar um "vestibular" ou "exame" para dar acesso ao ginásio, com número limitado de vagas (digamos, de cada 100 crianças do primário, apenas umas 60~70 deveriam poder ir pro ginásio). E depois, outro "exame" para o ensino médio, com menos vagas (das 60 que fizeram ginásio, só umas 40 deveriam poder cursar o ensino médio) - os alunos que não conseguissem passar nestes exames seriam direcionados para cursos profissionalizantes, para aprenderem ofícios.

12) Supletivos deveriam ter idade mínima (30~35 anos) e deveriam ter a matrícula condicionada a apresentação de comprovantes de trabalho/emprego, à semelhança de como deveriam ser os EJAs

13) Criar exigência de experiência profissional mínima para poder cursar Mestrado e Doutorado (para acabar com esse negócio de emendar faculdade com mestrado e doutorado, e com isso não formarmos mais  mestres e doutores que nunca colocaram a mão na massa e possuem uma visão apenas teórica sobre suas áreas de conhecimento) 

14) Criar exigência de idade mínima para cursos de Mestrado e Doutorado (eu acho muito estranho quando vejo um doutor de 30 ~35 anos! Doutor deveria ter uns 50, 60 anos, por aí. Mestres deveriam ter uns 40 anos, no mínimo. Isso faria com que somente pessoas com experiência de vida fossem para estes cursos, e não jovens recém-formados)


Não posso afirmar se as ideias acima, caso seguidas à risca, resolveriam os problemas de educação no Brasil, mas acredito que ajudariam bastante no longo prazo. Usei apenas o bom senso para pensar nestas ideias.

Enfim, confraria, estas são algumas de minhas opiniões sobre o nosso sistema de ensino. Será que exagerei alguma coisa? Talvez, mas não acho que escrevi nada muito fora da realidade. Pelo menos foram essas as coisas que vi em meus tempos de formação.


Forte abraço!

Fiquem com Deus!

Fora da caridade não há salvação!