Saudações, confrades.
Volta e meia fico pensando aqui em ideias de negócios tranquilos nos quais eu poderia trabalhar quando atingir a TF (Tranquilidade Financeira) em que eu possa ser dono do meu horário, não trabalhar até tarde, não ter chefes, etc. Não sei se minhas ideias são viáveis, não sei se daria para realisticamente viver de alguma destas ideias, mas pelo menos me servem como exercícios de reflexão e imaginação.
Desta forma, irei continuar a série que comecei "informalmente" no meu post de janeiro sobre casas de penhores, fazendo desta uma série sobre ideias para pequenos negócios.
Meus critérios aqui são: não precisar de muito dinheiro para fazer o investimento inicial, poder tocar o negócio com o mínimo de empregados possível para manter os custos baixos, e, se possível, poder trabalhar sozinho - estão vendo o efeito da CLT na cabeça do pequeno empreendedor? Olha como ela está me "incentivando" a contratar pessoas para me ajudar no meu negócio...
Agora, sem mais delongas, vamos à ideia de hoje:
Uma coisa que eu vejo com curiosidade hoje em dia é o trabalho dos jornaleiros. Atualmente, na "era da informação", cada vez menos pessoas lêem jornais e revistas, então eu fico me perguntando como os jornaleiros que ainda atuam na área estão fazendo para se virar, e me pergunto se ainda vale à pena ser jornaleiro.
Na minha cidade há muitas bancas de jornal, principalmente nos centros comerciais de cada bairro, e em muitas das ruas residenciais tem alguma (só na minha rua tem umas 3, e teve uma que abriu esse ano, vejam só), no entanto quase não vejo mais as pessoas lendo jornais ou revistas. Acho que o pessoal mais velho ainda lê bastante, e em todo consultório de médico/dentista que vou ainda vejo revistas, assim como no barbeiro que frequento. Também vejo algumas nos saguões de hotéis. As revistas e jornais ainda persistem, mas acho que a tendência é que no médio prazo não haja mais jornais e revistas impressos. Porém isso ainda deve demorar, e talvez este tipo de mercado passe a ser só para os assinantes (talvez com opções de assinatura, em que o cliente possa escolher se quer receber impresso ou só digital mesmo)
De qualquer maneira, jornais e revistas impressos devem estar representando uma fatia cada vez menor das receitas de vendas dos jornaleiros, e não sei como é o negócio deles, se eles ficam com os jornais por consignação e devolvem pra editora/distribuidora os que não forem vendidos, mas vejo que muitos jornaleiros estão se adaptando à nova realidade e focando em vender outras coisas. Na minha cidade muitos estão vendendo doces, salgados, refrigerantes, etc. Já vi alguns que vendem brinquedos colecionáveis, outros que vendem acessórios para celulares (fones de ouvido, cabos usb, carregadores, capas), e hoje em dia com o coronga vírus, alguns estão tirando uma grana extra vendendo máscaras de pano e frascos de "alquingel".
Minhas opiniões e análise do negócio em si:
- Uma coisa que eu vejo com bons olhos é que cada banca de jornal em si é uma pequena loja;
- geralmente uma banca de jornal possui boa localização;
- Acredito que sejam de fácil manutenção, ou seja, devem ter um custo fixo baixo, o que é bom para um pequeno comércio;
Mas, por outro lado:
- o espaço pequeno na banca provavelmente dificultará conseguir preços vantajosos com fornecedores de doces, salgados, refrigerantes, etc. pois a escala das compras será pequena. Isso também leva a mais gastos com frete (porque você precisa fazer mais encomendas, várias encomendas pequenas). Mesmo que você esteja disposto a comprar lotes maiores e deixar guardado em casa, provavelmente não conseguirá um bom preço (e ainda perderá espaço em casa)
- já li em discussões antigas na blogosfera das finanças (talvez no Pobretão? Ou no Corey? Não lembro mais) que há leis que regulam bastante o que uma banca de jornal pode vender, então deve haver municípios com leis mais draconianas restringindo bastante o comércio das bancas e deve haver aqueles com legislação mais suave.
Então conhecer a legislação municipal é fundamental para decidir entrar neste negócio, pois definirá o que você pode e não pode vender legalmente (se o empresário irá burlar isso, aí já é problema de cada um, mas eu não vejo isso com bons olhos porque toda informalidade possui um custo - geralmente este custo são as multas que você vai receber quando for fiscalizado, o que também pode resultar no confisco das mercadorias irregulares ou até mesmo no fechamento do seu comércio - vejam esta reportagem sobre o Rio de Janeiro).
(Aliás, confrades, praticamente todo pequeno comércio vai ser fortemente influenciado pela legislação municipal, então fiquem atentos! Recomendo o site leis municipais para pesquisarem leis de suas cidades para pelo menos evitarem fazer besteira)
Resumidamente, dependendo da lei de cada cidade, pode valer a pena ter uma banca de jornal e usá-la como uma mini-loja para vender outras coisas além de jornais e revistas, além de prestar eventuais serviços (por exemplo, tirar cópias, fazer impressões, recarga de celular, etc).
Portanto, para ver como esse assunto é tratado de maneira diferente conforme a cidade, vou analisar brevemente algumas leis municipais que regulam as bancas de jornais em algumas cidades do Brasil, de tamanhos e regiões diversas:
1) São Paulo >> a profissão de jornaleiro é regulamentada em São Paulo pela lei 10.072/1986. Infelizmente, o município trata as bancas como se fossem sua propriedade e cede o uso através de licitação (2/3 das bancas, e funciona como um leilão: leva quem dar o maior lance do valor anual a ser pago pela permissão) e sorteio (1/3 das bancas, mas somente para viúvas e inválidos) e pelo que entendi da lei ainda há um valor de aluguel definido em decreto. Além disso, a lei impõe uns limites bem idiotas a respeito do que pode ser vendido nas bancas: bebidas de até 600ml, doces de até 200g, não pode vender bebidas alcóolicas, e 75% do espaço da banca tem que estar ocupado por jornais e revistas, dentre outras restrições. Por exemplo, é proibido a um jornaleiro em São Paulo vender Guaraná Antartica 2L. Besteira pura.
2) Rio de Janeiro >> regulamentada pela lei 3.425/2002. Há restrições para os tipos de mercadorias que podem ser vendidas, mas pelo menos a lei não menciona restrições em relação ao peso e volume das bebidas e doces comercializados e nem determina uma cota mínima da área interna da banca a ser preenchida com jornais e revistas. A lei também menciona o pagamento de uma taxa de autorização de exercício da profissão e também uma taxa de uso de espaço público. Pelo menos não exige uma licitação, mas o interessado deve pedir autorização no órgão competente. Além disso, a área máxima permitida da banca é de 18m². Uma coisa que assusta é a possibilidade da autorização ser cancelada a qualquer momento por motivo de "interesse público".
3) Goiânia >> regulado pela Lei complementear nº 14 de 1992. Para mim a coisa mais gritante é a proibição de colocar anúncios na banca, o que certamente dificulta a vida dos jornaleiros por lá. Tem várias restrições de localização e de tamanho da banca, e é necessário obter autorização no órgão competente, e como em todos os casos que pesquisei, é uma autorização que a qualquer momento pode ser retirada. Pelo menos não vi restrições sobre o que pode ser vendido, o que é um ponto bem positivo.
A título de curiosidade, vejam esta reportagem sobre um jornaleiro de Goiânia e sua saga para se virar nos dias atuais.
4) João Pessoa >> regulado lei complementar nº 7 de 1995 (código de posturas da cidade de João Pessoa), a qual começa parecendo mais um código de vigilância sanitária, e disciplina aspectos de higiene a serem observados por vários comércios. Coloca algumas determinações para as bancas de jornal (ser de metal, terem cobertura para que o sol não bata direto nos alimentos vendidos, etc.). Mais para a frente, a partir do art.113, estão as regras específicas para bancas de jornal. Não fala de proibições de venda mas tem regras de localização da banca, fala que ela tem que ser feita conforme o modelo aprovado pela prefeitura, etc. Pelo menos não vi restrições sobre o que se pode vender.
5) Petrópolis >> as bancas são mencionadas na lei 6.240 de 2005 e a regulação começa a partir do artigo 114, e achei bem detalhado. Cheio de restrições, e de comida só podem vender sorvete e refrigerantes. Por outro lado, achei interessante que a lei fala explicitamente que a banca pode oferecer serviços de chaveiro, então seria uma boa combinar as duas atividades, a meu ver. É o que eu faria. Vejam esta notícia (já antiga) sobre mudanças que os jornaleiros de Petrópolis querem (queriam?) fazer na lei.
6) Blumenau >> o assunto é regulado pela lei 2047 de 1974, e embora a parte do texto que fala sobre as bancas de jornais seja curta, as restrições são grandes. O trecho mais marcante é esse:
"Art. 187 - Somente poderão ser vendidos nas bancas de jornais: revistas, almanaques, guias da cidade e de turismo, cartões postais, livros de bolso, bilhetes de loteria, figurinhas, mapas, cupões de concurso e de sorteio, discos com finalidades pedagógicas ou culturais." Será que os jornaleiros de Blumenau cumprem rigorosamente este artigo absurdo? Este artigo pode inviabilizar o negócio de jornaleiro por lá se não for revisto...
7) Araucária >> as bancas de jornal mal são citadas na lei complementar 23 de 2020, então isso me leva a crer que esta profissão seja bem mais livre nesta cidade do que em todas as outras mencionadas neste post. Espero que continue assim.
Após estas breves análises das leis, pude perceber que a regra geral é a prefeitura tratar a banca de jornal como uma pequena extensão da administração municipal, submetendo o jornaleiro a sempre ter que renovar sua licença e impondo várias restrições quanto ao tamanho e à localização das bancas.
Eu concordo com algumas das restrições, realmente acho que se fosse 100% liberado poderia virar bagunça (vide os locais onde há muitos camelôs, que tomam calçadas inteiras e dificultam a passagem de pedestres), então acho válido limitar o tamanho das bancas e impor uma distância mínima entre cada uma.
Na minha opinião as piores leis municipais são aquelas que restringem o que as bancas de jornal podem vender, e a de São Paulo é a mais ridícula que eu vi, querendo limitar o peso dos doces que os jornaleiros podem vender.
O que eu faria se resolvesse ter um negócio assim:
- Capital inicial: a partir de R$ 35.000 para comprar a banca (a banca mais barata que vi no Mercado Livre custava R$ 20.000,00, e é óbvio que quanto maior a cidade maior o custo para aquisição da banca e o aluguel. Eu vi bancas de SP sendo vendidas por R$ 400K, mas aí já foge da alçada deste artigo determinar se vale à pena, pois a minha ideia aqui são pequenos negócios que se possa começar com relativamente pouco dinheiro)
- Apesar de este ser um comércio em declínio creio que uns 20~30% do faturamento de uma banca ainda sejam de jornais e revistas, conforme a pesquisa que fiz, então eu venderia sim jornais e revistas (e tem cidades onde você é obrigado por lei a vender isso, para não "descaracterizar a profissão")
- Creio que o meu negócio mesmo seriam doces, refrigerantes, cigarros, e várias miudezas não perecíveis, que jornaleiros vendem (isqueiros, brinquedos, fone de ouvido, carregadores, etc.).
- Prestaria alguns serviços para complementar a renda (xerox, scan, consulta SPC SERASA, recarga de celular, cópia de chaves, etc.) conforme a legislação municipal permitisse (óbvio que eu não seria jornaleiro em um município cheio de restrições)
- Alugaria espaços para anúncios na estrutura da banca (será que isso "garante" uma renda mensal?)
Riscos do negócio:
- perder a autorização municipal "por interesse público"
- do nada a legislação municipal mudar e se tornar mais restrita quanto ao tipo de produtos que eu posso vender
- as taxas de manutenção das licenças de jornaleiro me parecem ser bastante arbitrárias, com valores fixos em alguns municípios, ou em valores dependentes de "unidades fiscais", o que pode fazer com que sejam superdimensionadas. O ideal seria que essa taxa fosse un percentual do lucro, seria mais justo. Mas não é assim, então um risco do negócio é faturar menos do que o valor da taxa de manutenção da licença
- a prefeitura te obrigar a mudar seu ponto e com isso você perder clientes por conta da perda de visibilidade
E vocês, confrades? O que acham deste tipo de negócio? Será que vale a pena? Algum leitor é ou já foi jornaleiro? Compartilhe sua experiência!
Forte abraço, fiquem com Deus!